O concílio dos deuses
Neste momento, é convocado o 
Concílio dos deuses (estrofes 20 a 41) para decidir se os portugueses devem ou não conseguir alcançar o seu destino. 
Júpiterafirma que sim, porque isso lhes está predestinado.
 
Baco discorda porque, se isto for permitido, as suas próprias conquistas no Oriente serão esquecidas, ultrapassadas por este povo. Mas 
Vénus vê os portugueses como herdeiros dos seus amados 
romanos e sabe que será celebrada por eles. 
Camões era um homem de paixões, que também celebrava o 
amor na sua 
lírica, e talvez por isso tivesse escolhido a deusa romana desse sentimento para patrona do seu povo.
 
Segue-se um tumulto, com os restantes 
olímpicos a tomar partido de Baco ou Vénus, até que o poderoso 
Marte se impõe, assustando 
Apolo num aparte (estrofe 37). O amante de Vénus, e admirador dos feitos guerreiros dos portugueses, lembra que não só já é merecido que consigam realizar a sua façanha, como Júpiter já tinha decidido conceder esse favor e não deveria voltar atrás na palavra. O rei dos deuses concorda e encerra o 
concílio.
 
O discurso com que Júpiter começa a reunião é uma acabada peça de 
oratória. Abre com o inevitável 
exórdio (1ª estrofe) em que, depois de uma original saudação, expõe brevemente o tema a desenvolver. Segue-se, ao modo da 
retórica antiga, a narração (o passado mostra que a intenção dos 
fados é mesmo a que o orador apresentou). Vem depois a confirmação: com factos do presente corrobora o que já, a seu modo, a narração comprovara (4ª estrofe). E termina com duas estrofes de 
peroração, onde se apela à benevolência dos deuses para com os filhos de 
Luso - aliás, a decisão dos fados cumprir-se-á inexoravelmente. Contra o que seria de esperar, Júpiter conclui determinando e não abrindo o debate.
 
“A viseira do elmo de diamante Alevantando um pouco, mui seguro, Por dar seu parecer, se pôs diante De Júpiter, armado, forte e duro: E dando uma pancada penetrante, Com o conto do bastão no sólio puro, O Céu tremeu, e Apolo, de torvado, Um pouco a luz perdeu, como enfiado.” | 
- — Descrição de Marte no concílio. Canto I, estrofe 37
  
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A ilha de Moçambique e o piloto mouro
A acção volta então à frota lusa, que chega à ilha de 
Moçambique. São acolhidos por 
muçulmanos que, intimidados pelo poderio bélico das 
naus, lhes prometem mantimentos e um 
piloto que os leve à Índia. Mas as suas verdadeiras intenções são a destruição dos portugueses. A inspiração do soberano 
mouro vem de Baco, que tomara a forma mortal de um dos seus conselheiros.
 
A primeira estratégia é atacar os 
marinheiros que forem a terra abastecerem-se de 
água. Mas estes, cuidadosos, vão armados e desbaratam as forças inimigas, prosseguindo depois com o bombardeamento da cidade. O regedor rende-se e oferece então um piloto que os conduza para terras inimigas, a segunda estratégia do deus do 
vinho.
 
Por duas vezes o piloto indica bons portos de acolhimento: uma terra de 
cristãos, que será uma referência ao reino de 
Preste João, e outra em que cristãos e muçulmanos viveriam juntos. 
Vasco da Gama confia no piloto. Mas Vénus, vendo que na realidade se trata de terras de muçulmanos capazes de vencer os portugueses, desvia a frota com ventos contrários. O primeiro porto é ultrapassado; o segundo é Mombaça, a pouca distância do qual a frota lança 
âncora. E o canto termina com duas estrofes plenas de 
suspense.
 
Canto II
O 
rei de 
Mombaça envia um mensageiro com promessas de bom acolhimento e pede que a 
armada entre no porto da cidade, mas com a intenção de armar uma emboscada. 
Vasco da Gama envia primeiro dois 
degredados à cidade para passarem a noite e avaliarem a situação. Enganados pelos mouros e por 
Baco, estes aconselham a entrada em Mombaça. Mas Vénus interfere mais uma vez, e com a ajuda das 
Nereidas impede a entrada dos 
navios portugueses.
 
Vénus sai então em direcção aos céus (estrofe 33). Seduz 
Júpiter com a sua beleza e queixa-se dos perigos que a expedição está a correr. O rei dos deuses reafirma que os fados já destinaram sucesso para os portugueses e envia 
Mercúrio para avisar Vasco da Gama da existência de 
Melinde, onde encontrará um rei justo e bondoso, que fornecerá tudo o que procura.
 
Chegada a Melinde
Depois de interrogarem prisioneiros feitos em Mombaça, é confirmada a boa notícia do reino de Melinde. A frota dirige-se para lá e é bem recebida. Apesar de naturalmente romanceado, este episódio é um 
documentário da 
descoberta de novas terras e novos povos. De uma grande riqueza descritiva, por ele se consegue "ver" Melinde e os melindanos, como se apresentou a esquadra portuguesa, a recepção que teve, como foram as reacções de uns e de outros, e como foi feito o contacto 
diplomático.
 
Canto III
“Golpes se dão medonhos e forçosos; Por toda a parte andava acesa a guerra: Mas o de Luso arnês, couraça e malha Rompe, corta, desfaz, abola e talha.” | 
- — Batalha de Ourique. Canto III, estrofe 51
  
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Egas Moniz
Neste episódio (estrofes 35 a 41) conta-se a história do aio de D. Afonso Henriques. Tendo dado a sua palavra ao 
rei de Castela que o soberano português lhe prestaria 
vassalagem, conseguiu o levantamento do 
cerco castelhano a 
Guimarães. Mas como D. Afonso Henriques se recusou a acatar estas condições, 
Egas Moniz foi entregar-se ao rei castelhano, com a mulher e os filhos, comovendo a todos pela sua lealdade e honra.
 
Batalha de Ourique
É mais um exemplo de uma vívida 
batalha épica, em que os portugueses enfrentam um inimigo cem vezes superior em número. O corajoso exército «
Rompe, corta, desfaz, abola e talha» as forças inimigas, pondo os restantes em fuga apavorada. No final, tantos são mortos em batalha que o 
sangue destes corre em rios e pinta o campo verde e branco de 
carmesim.
 
A descrição das conquistas do rei Afonso continua (estrofes 55 a 68) em ritmo acelerado: 
Leiria,
Arronches, 
Santarém, 
Mafra, 
Sintra, 
Lisboa, 
Óbidos, 
Alenquer, 
Torres Vedras, 
Elvas, 
Moura, 
Serpa, 
Alcácer do Sal, 
Évora, 
Beja,
Palmela, 
Sesimbra, 
Badajoz.
 
Dinastia de Borgonha
Nesta última cidade D. Afonso acaba por ser cercado pelo 
rei de Leão, e Camões introduz o seu herdeiro 
D. Sancho I na história, que se torna no assunto do canto bélico juntamente com o pai, e depois da morte deste (estrofes 83 e 84) como rei.
 
Inês de Castro
“Traziam-na os horríficos algozes Ante o Rei, já movido a piedade: Mas o povo, com falsas e ferozes Razões, à morte crua o persuade. Ela com tristes o piedosas vozes, Saídas só da mágoa, e saudade Do seu Príncipe, e filhos que deixava, Que mais que a própria morte a magoava” | 
- — Sobre Inês de Castro. Canto III, estrofe 124
  
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O turbilhão de emoções continua com este episódio lírico-trágico (estrofes 118 a 135), talvez o mais reconhecido d'
Os Lusíadas. Convém que se não perca de vista a sua integração no poema, via alocução de 
Vasco da Gama ao rei de 
Melinde. Costuma-se classificá-lo como lírico, distinguindo-o assim, sobretudo, dos mais comuns episódios bélicos.
 
D. Inês e 
D. Pedro são os amantes trágicos por excelência. O seu 
amor é ilícito, proibido pelos poderes. O poeta que tinha escrito 
sonetostão sombrios, de sofrimento amoroso, chama repetidamente este de «
puro amor», e censura o rei, de quem tanto elogiara os feitos guerreiros, por esta sombra no seu reinado.
 
D. Afonso IV pretende casar o filho que, apaixonado por Inês, recusa. A solução é eliminá-la. Trazida à presença do rei, esta implora pela sua 
vida, só para poder cuidar dos seus filhos. Comove o velho soberano, mas os conselheiros e o povo exigem a 
morte. E assim a frágil e bela apaixonada é 
assassinada «
só por ter sujeito O coração a quem soube vencê-la» (por amar quem soube conquistar o seu coração).
 
Uma rápida análise do episódio permite encontrar aí presentes, com maior ou menor clareza, elementos 
trágicos como o 
destino, que conduz a acção para o final trágico; a 
peripécia; até algo próximo do papel do 
coro (
apóstrofes). A 
nobreza moral e 
social dos personagens é também salientada, de modo a criar no leitor sentimentos de 
terror e de 
piedade perante a desgraça que se abate sobre a protagonista (
catástrofe).
 
Quando Inês teme mais a 
orfandade dos filhos que a própria perda da vida, quando ela suplica a comutação da 
pena capital por um
exílio na 
Sibéria (Cítia) ou na 
Líbia, entre «
toda a feridade», só para poder criar os filhos do seu amor, quando é comparada com «
a linda moça Policena, consolação extrema da mãe velha», quando o leitor escuta toda a estrofe 134, e mesmo a 135, estão-se a dedilhar os acordes da piedade. Já os versos iniciais da estrofe 124, a apóstrofe com que termina a 130 (e antes a da segunda metade da 123) e a estrofe 133 estão ao serviço da sugestão do terror trágico.
 
D. Fernando
Depois da vingança de D. Pedro, 
o cruel, é apresentado o brando 
D. Fernando, responsabilizado pela quase perda do reino durante as 
guerras fernandinas e pela 
crise que o país enfrentaria após a sua morte.
 
Interpretando estas crises como consequência ou castigo do amor do rei por 
Leonor Teles, o romântico poeta acrescenta «
Mas quem pode livrar-se por ventura Dos laços que Amor arma brandamente». Por isso, continua, o monarca tem desculpa (estrofe 143) para quem já amou, quem nunca amou será mais ríspido nas críticas.
 
Canto IV
Batalha de Aljubarrota
A narrativa da revolução de 1383-85 é dividida em duas partes: o levantamento do 
povo para apoiar o pretendente português (estrofes 1 a 23), e a 
batalha de Aljubarrota (estrofes 24 a 44). Dois heróis partilham as glórias destes episódios: o régio 
D. João e o guerreiro D. 
Nuno Álvares Pereira.
 
Camões elogia os 
patriotas que defenderam a 
independência, quer sejam humildes ou poderosos, sem medo de morrer pela causa portuguesa. Critica amarguradamente quem se juntou ao partido castelhano, particularmente os irmãos de Nun'Álvares, que tem de lidar com o conflito acrescido de lutar contra os seus familiares.
 
Os feitos do 
Mestre de Avis também são cantados de forma particularmente épica, fazendo lembrar 
Ájax na 
Ilíada. A sua coragem salva a batalha. Socorre a Ala dos Namorados que se encontrava na vanguarda e, na estrofe 38, "
sopesando a lança quatro vezes, Com força (a)tira; e, deste único tiro, Muitos lançaram o último suspiro".
 
“Eis ali seus irmãos contra ele vão, (Caso feio e cruel!) mas não se espanta, Que menos é querer matar o irmão, Quem contra o Rei e a Pátria se alevanta:” | 
- — Sobre D. Nuno Álvares Pereira na Batalha de Aljubarrota, Canto IV, estrofe 32
  
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Mas no fim de mais uma batalha sanguinária, a par com o canto da glória, o poeta deixa a opinião de quem maldiz a 
guerra, que por cobiça dos poderosos lança tanta gente à morte, deixando tantas mães e esposas sem maridos e filhos.
 
Partida das Naus
O Velho do Restelo
O canto termina com a partida da armada. Quando estão a despedir-se das famílias na praia de 
Belém, os 
navegadores são surpreendidos pelas palavras de um velho que estava entre a multidão. É o episódio do 
Velho do Restelo (estrofes 94 a 104).
 
Este personagem é a representação da contestação da época contra as aventuras dos 
descobrimentos. Havia quem pensasse que era puro orgulho e simplesmente 
suicídio tentar estes projectos de navegar para partes longínquas do mundo; uma perda de recursos e homens, que fariam falta na luta contra os inimigos 
mouros ou para a defesa do reino contra uma eventual invasão castelhana.
[4] 
O episódio entrou no imaginário português. A expressão passou a significar o 
conservadorismo, o mau agoiro, a má-vontade e a falta de espírito de 
aventura, frente a projectos originais que exigem alguma ousadia e gastos de recursos.
 
Canto V
Fernão Veloso
“Disse então a Veloso um companheiro (Começando-se todos a sorrir) -"Ó lá, Veloso amigo, aquele outeiro É melhor de descer que de subir." - "Sim, é, (responde o ousado aventureiro) Mas quando eu para cá vi tantos vir Daqueles cães, depressa um pouco vim, Por me lembrar que estáveis cá sem mim” | 
- — Fernão Veloso, Canto V, estrofe 35
  
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Aportados na costa africana, os portugueses fizeram contacto com os povos nativos. Este aventureiro (estrofes 30 a 36), convidado para conhecer a sua 
aldeia, acompanhou despreocupadamente os anfitriões. Mas, percebendo as intenções 
assassinas destes, «
Mais apressado do que fora, vinha», perseguido por um grupo.
 
É um episódio também 
humorístico, pela bazófia do português. Depois de uma escaramuça para o salvarem, os companheiros fazem troça da sua fuga apressada, depois de, com tanta confiança, ter entrado pela terra adentro na companhia dos 
nativos. A isto ele responde que, vendo como tantos inimigos voltavam para atacar a 
praia, vinha a correr só para ajudar a frota, «
Por me lembrar que estáveis cá sem mim».
 
O Adamastor
Podem-se considerar três partes no episódio do 
Adamastor: a primeira é uma 
teofania (estrofes 37 a 40). Chegados ao 
Cabo das Tormentasno meio da uma 
tempestade, os marinheiros avistam o 
titã, tão terrível que «
Arrepiam-se as carnes e o cabelo A mi e a todos só de ouvi-lo e vê-lo». Aqui está o puro pavor, a ameaça iminente da aniquilação, fisicamente sentida - as carnes engelham-se, os cabelos crispam-se.
 
O espectáculo é envolvente, grandioso, terrificante. Este 
semideus maléfico, encarnação dos perigos da arriscada travessia, precede-se de uma 
nuvem negra, que surge rasante sobre as cabeças dos navegantes. Mas mais surpreendente ainda é a orquestração que o 
mar faz com este elemento aéreo «
Bramindo, o mar de longe brada, Como se desse em vão nalgum rochedo». O lado maravilhoso desta aparição também é acentuado, fazendo contrastar todo o espectáculo de disformidade e gigantismo com o cenário precedente, onde são manifestos os encantos de uma noite dos "mares do Sul", «
prosperamente os ventos assoprando».
 
Então começa a segunda parte do episódio (estrofes 41 a 48), que em termos cronológico-narrativos é uma 
prolepse. O Adamastor fala e, como um 
oráculo, vaticina o 
destino cruel que espera alguns dos navegadores que atravessarão os seus domínios. É uma forma inteligente de o poeta dos meados do 
século falar de acontecimentos do 
passado, mas que seriam 
futuros para o navegador do início do século que faz a narração.
 
Finalmente surge uma 
écloga marinha (estrofes 49 a 59), que obedece a um desenvolvimento comum a muitas composições 
líricas de 
Camões: o enamoramento (de Adamastor por 
Tétis, não correspondido), a separação forçada (pela 
titanomaquia), a traição, o lamento pelo sonho frustrado, do qual o sofredor é constante e eternamente recordado: «
Enfim, minha grandíssima estatura, Neste remoto cabo converteram Os Deuses, e por mais dobradas mágoas, Me anda Tétis cercando destas águas».
 
Passado mais este obstáculo, os navegadores agora enfrentam a doença, particularmente o 
escorbuto, e um clima a que não estão habituados. Apesar de um acolhimento cordial dos povos da 
África do Sul, o desânimo também aumenta por não haver quem dê notícias sobre a 
Índia. Até que, depois de 
Moçambique e 
Mombaça, a 
narrativa termina com a alegria da chegada a 
Melinde.
 
O canto encerra com a admiração dos melindanos por toda a 
epopeia portuguesa, e a censura do poeta pela 
iliteracia dos seus
conterrâneos. Pela boca de Vasco da Gama, que lhe empresta legitimidade, conta como os poderosos do mundo, especialmente
gregos e 
romanos, eram amantes das letras. E lamenta que os seus contemporâneos desprezem a 
língua, a 
poesia e o cantar e louvar de 
heróis e povos.
 
Canto VI
Finda a narrativa de Vasco da Gama, e os festejos dos melindanos, a armada sai, guiada por um piloto que deverá guiá-la até 
Calecute.
 
Os doze de Inglaterra
Nos tempos de 
D. João I, doze cavaleiros ingleses teriam ofendido a honra de doze 
damas inglesas, e lançado o desafio a quem quisesse defendê-las em um torneio. Uma vez que estes eram homens poderosos da 
Inglaterra, não havia compatriotas que se atrevessem a enfrentá-los. Assim, o 
duque de Lencastre João de Gante lançou um apelo ao seu genro 
rei de Portugal.
 
Em resposta, armaram-se imediatamente doze cavaleiros portugueses para partir do 
Porto para aquele país. Mas só onze embarcaram. O 12.º era
Álvaro Gonçalves Coutinho, 
o Magriço, que resolveu ir primeiro por terra até à 
Flandres. Depois de algumas aventuras, chegou ao local da justa no preciso momento em que esta ia começar e, com a sua ajuda, todos os cavaleiros ingleses foram derrotados, salvando-se a honra das damas ofendidas.
 
A tempestade
“O céu fere com gritos nisto a gente, Com súbito temor e desacordo, Que, no romper da vela, a nau pendente Toma grã suma d'água pelo bordo: "Alija, disse o mestre rijamente, Alija tudo ao mar; não falte acordo. Vão outros dar à bomba, não cessando; A bomba, que nos imos alagando!"” | 
- — A tempestade, Canto VI, estrofe 72
  
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A história de Veloso é interrompida pela chegada da 
tempestade provocada pelos deuses marinhos (estrofes 70 a 84). É uma descrição dramática de quem viveu situações semelhantes e conhece a 
gíria náutica: os 
ventos, a ondulação, a quebra de 
mastros, as 
naus alagadas, os gritos dos marinheiros, 
relâmpagos e trovões.
 
Vendo as suas embarcações quase perdidas, Vasco da Gama dirige uma prece a 
Deus. Mais uma vez, é 
Vénus que ajuda os portugueses, mandando as 
ninfas seduzir os ventos para os acalmar. Dissipada a tempestade, a armada avista Calecute e o capitão agradece a mercê divina.
 
O canto termina com considerações do poeta sobre o valor da 
fama e da glória conseguidas através dos grandes feitos, e uma crítica a quem procura estas e a fortuna por intriga e favor dos poderosos.
 
Canto VII
Este canto inicia com a comparação dos feitos dos portugueses contra os 
muçulmanos, expandindo o
cristianismo e fazendo a 
guerra santa, com os conflitos internos da 
Europa (estrofes 2 a 15). Segundo o ponto de vista de Camões, os 
reis e os 
nobres das outras nações europeias perdem-se em guerras intestinas, inglórias e injustas. Os 
alemães, franceses e 
ingleses renegam a verdadeira 
fé e enfraquecem o poder cristão. Os italianos são corruptos, lutando uns contra os outros com o único objectivo do ganho pessoal. Pelo contrário, só os portugueses, com as mais nobres intenções, lutam contra os 
mouros e 
turcos.
 
Assim que aporta em 
Calecute, Vasco da Gama envia um mensageiro ao soberano indiano. No meio deste novo povo, com quem não consegue falar, o marinheiro encontra Monçaide, um mouro 
hispânico falante de 
castelhano, que o acolhe e lhe serve de
tradutor. Monçaide acompanha-o até à frota e explica aos portugueses um pouco da 
geografia, 
história, 
política, 
religiões e costumes da 
Índia.
 
O capitão e Monçaide desembarcam e encontram-se com o Catual, um ministro que os acompanha até ao 
Samorim (estrofes 43 a 65). A descrição do que os portugueses vêem é um exemplo da 
sociologia da descoberta e da interpretação de uma cultura absolutamente nova. É proposto um 
tratadocomercial e, enquanto o soberano indiano pondera, a embaixada volta à 
nau capitânia. Aqui encontra-se um painel representando a 
história de Portugal.
 
Mas antes da explicação deste, sentindo-lhe faltar a inspiração, 
Camões conta um pouco da sua 
biografia e lança-se num lamento indignado pelo modo como a sua pátria o tem tratado, a quem só pretende cantar a glória portuguesa (estrofes 78 a 87).
 
Canto VIII
Painel da história de Portugal
De seguida vêm o 
Conde D. Henrique e 
D. Afonso Henriques, juntamente com algumas personalidades que se evidenciaram durante a 
primeira dinastia:
Egas Moniz, D. 
Fuas Roupinho, o 
prior D. Teotónio, 
Mem Moniz, 
D. Sancho I, 
Geraldo Sem Pavor, Martins Lopes (que capturou Pedro Fernando de Castro, renegado 
leonês aliado aos 
mouros), o 
bispo D. 
Soeiro Viegas, D. 
Paio Peres Correia.
 
Tratado com o Samorim
“Sabe que há muitos anos que os antigos Reis nossos firmemente propuseram De vencer os trabalhos e perigos, Que sempre às grandes coisas se opuseram; E, descobrindo os mares inimigos Do quieto descanso, pretenderam De saber que fim tinham, e onde estavam As derradeiras praias que levavam.” | 
- — Discurso de Vasco da Gama, Canto VIII, estrofe 7
  
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O 
Samorim entretanto manda examinar os augúrios que, segundo o poeta, por serem 
pagãos são facilmente enganados pela sua fé errada. O 
Demónio engana-os dando a previsão de que os
portugueses virão a subjugar toda a 
Índia. Isto é confirmado pelos conselheiros islâmicos do soberano, a quem durante a noite 
Baco visitara durante os 
sonhos, fazendo-se passar por 
Maomé, acusando os ocidentais de 
pirataria e incitando à destruição a frota.
 
No dia seguinte, o Samorim tem de decidir entre as vantagens económicas do tratado com os portugueses e as previsões catastróficas da noite. Chamando 
Vasco da Gama, acusa-o de 
apátrida e 
pirata, incitando-o a confessar a verdade. O navegador responde com dignidade (estrofes 65 a 75), reafirmando as suas intenções, e sai da audiência com autorização para comercializar.
 
Mas o ministro indiano, influenciado pelos 
muçulmanos do reino, faz o capitão de refém e tenta trazer a frota portuguesa para mais perto, para a poder assaltar. Quando esta estratégia falha, cobiçando o lucro e temendo o castigo do seu soberano por estar a desobedecer às suas ordens, aceita trocar Vasco da Gama por mercadorias das 
naus.
 
Canto IX
O Catual ainda tenta demorar os portugueses, proibindo o 
comércio com os 
feitores das naus, para dar tempo que chegue uma armada muçulmana do 
Mar Vermelho. Mas Monçaide, convertido agora ao 
cristianismo, consegue informar o capitão português dos planos dos inimigos, vender a 
mercadoria e obter 
especiarias.
 
Ao mesmo tempo, Vasco da Gama aprisiona alguns importantes do reino de 
Calecute e troca-os pelos feitores, entretanto aprisionados. Com mercadoria e alguns prisioneiros indianos, a frota tem 
provas da 
chegada à Índia e zarpa.
 
A Ilha dos Amores
Vendo agora a frota em segurança no seu regresso a 
Portugal, Vénus pede a ajuda do seu filho 
Cupido para juntar os 
amores e ferir as 
nereidas com as 
flechas do 
amor. Com as 
ninfas e 
Tétissob esta influência, coloca uma 
ilha mística na 
rota dos portugueses, e a ela traz os amantes.
 
“Ó que famintos beijos na floresta, E que mimoso choro que soava! Que afagos tão suaves, que ira honesta, Que em risinhos alegres se tornava! O que mais passam na manhã, e na sesta, Que Vénus com prazeres inflamava, Melhor é experimentá-lo que julgá-lo, Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.” | 
- — A Ilha dos Amores. Canto IX, estrofe 83
  
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- O locus amoenus: o cenário onde decorre o encontro amoroso (estrofes 52 a 67 e mais algumas até ao final do canto) é típico do locus amoenus, com os seus chãos maciamente relvados, águas límpidas e cantantes, arvoredos frondosos e até um lago. O poeta fala ainda da simpática fauna que aí se cria e dos frutos que se produzem sem cultivo. É um cenário paradisíaco, idílico, de écloga.
 
- A alegoria: com um arrojo inesperado para um maneirista, Camões descreve o encontro dos nautas com as ninfas que os esperavam, industriadas por Vénus. O amor que experimentam é de paixão: imediato, arrebatado e carnal. E fica dado o recado aos que condenam a expressão mais física do amor: «Melhor é experimentá-lo que julgá-lo, Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.»
 
- A recompensa dos portugueses tem um sentido alegórico: «Que as Ninfas do Oceano, tão fermosas, Tethys e a Ilha angélica pintada, Outra cousa não é que as deleitosas Honras que a vida fazem sublimada» (estrofe 89). A terminar o canto, dirigindo-se ao leitor, reforça a intenção alegórica e incita aos feitos de valor: «Impossibilidades não façais, Que quem quis sempre pôde: e numerados Sereis entre os heróis esclarecidos E nesta Ilha de Vénus recebidos».
 
- Leonardo: Camões, o indefectível cantor do amor, não quis, e se calhar não pôde, evitar que isso se reflectisse n'Os Lusíadas. Se os amores mal sucedidos do Adamastor deixam entrever o caso real do poeta, Leonardo (estrofes 75 a 82) aqui representa a consumação do seu sonho. Repare-se que as queixas deste navegante recordam as do poeta na lírica e como é um lamento delicado e belo.
 
Em um pormenor curioso, houve a intenção de separar e dignificar 
Vasco da Gama na carnalidade do episódio. É acompanhado por 
Tétis até a um magnífico 
palácio de 
cristal e 
ouro, enquanto os restantes marinheiros e as suas companheiras ficam nas 
praias e nos 
bosques.
 
Canto X
A profecia da Sirena